SANÇÕES
ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS
Talden
Farias
A
Lei n. 9.605/98, que ficou conhecida como “Lei de Crimes
Ambientais”, dispõe sobre a responsabilidade administrativa
ambiental nos arts. 70 a 761.
O objetivo da responsabilidade administrativa ambiental é fazer com
que as irregularidades ambientais sejam apuradas e punidas na própria
esfera administrativa, sem necessariamente recorrer ao Poder
Judiciário.
Para
cada infração ou irregularidade ambiental identificada o órgão
competente deverá impor a sanção administrativa ambiental
correspondente, de acordo com a previsão normativa. O caput
do art. 70 da citada lei define infração
administrativa ambiental como “toda ação ou omissão que viole as
regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e recuperação
do meio ambiente”.
O
Decreto Federal n. 6.514/08 regulamentou as sanções administrativas
previstas nesse dispositivo legal como sendo as punições para as
infrações administrativas ambientais, sem prejuízo da aplicação
de outras penalidades legalmente estabelecidas. Esse
decreto enquadra as infrações administrativas ambientais nos arts.
24 a 93 na seguinte ordem: a) Das infrações contra a fauna: arts.
24 a 42; b) Das infrações contra a flora: arts. 43 a 60-A; c) Das
infrações relativas à poluição e outras infrações ambientais:
arts. 61 a 71-A; d) Das infrações contra o ordenamento urbano e o
patrimônio cultural: arts. 72 a 75; e) Das infrações
administrativas contra a Administração Ambiental: arts. 76 a 83; e
f) Das infrações cometidas exclusivamente em Unidades de
Conservação: arts. 84 a 93.
Tais
infrações correspondem a descrições legais e genéricas de
comportamentos vedados, como cortar árvores em área considerada de
preservação permanente ou causar poluição de qualquer natureza em
níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde
humana ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição
significativa da biodiversidade2.
Caso se depare com tais situações, o órgão ambiental deverá
obrigatoriamente aplicar a sanção correspondente de acordo com a
previsão legal, não existindo discricionariedade quanto a isso.
De
acordo com o art. 72 da Lei n. 9.605/98, as infrações
administrativas ambientais são punidas com as seguintes sanções:
a) advertência; b) multa simples; c) multa diária; d) apreensão
dos animais, produtos e subprodutos da fauna e flora, instrumentos,
petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer natureza utilizados
na infração; e) destruição ou inutilização do produto; f)
suspensão de venda e fabricação do produto; g) embargo de obra ou
atividade; h) demolição de obra; i) suspensão parcial ou total de
atividades; j) restritiva de direitos.
Para
cada infração administrativa ambiental deve ocorrer a imposição
da sanção correspondente, podendo ser aplicadas duas ou mais
sanções de forma simultânea nos termos do que determina o § 1º
da lei mencionada. Isso significa que é possível aplicar ao mesmo
tempo duas ou três sanções administrativas ambientais diferentes,
a exemplo de multa simples, embargo e suspensão de venda e
fabricação do produto, quando se tratar de uma só infração.
Também
é possível aplicar duas ou mais sanções da mesma espécie de uma
única vez, a exemplo de duas ou três multas simultâneas, desde que
cada infração decorra do desrespeito a um preceito legal
específico. Com relação aos critérios para gradação da
penalidade, a Lei n. 9.605/98 leva em consideração a gravidade, os
antecedentes e o porte econômico3.
Em
regra as sanções administrativas ambientais são dotadas de
autoexecutoriedade, que é a característica de imposição direta e
imediata de seus efeitos jurídicos independentemente de comunicação
ou de solicitação a qualquer outro Poder4.
Contudo, existem exceções, posto que a multa, a destruição ou
inutilização do produto e a demolição de obra a rigor não podem
ser autoexecutáveis, no primeiro caso por envolver pecúnia e no
segundo e terceiro caso pela drasticidade e pela irreversibilidade da
medida.
A
exemplo do que ocorre com a responsabilidade civil, a
responsabilidade administrativa ambiental também costuma encontrar
fundamento na regra da objetividade. Com efeito, ao conceituar
infração administrativa ambiental como “toda ação ou omissão
que viole as regras jurídicas de uso, gozo, promoção, proteção e
recuperação do meio ambiente” tanto no art. 70 da Lei n. 9.605/98
quanto no Decreto n. 6.514/08, o legislador não deixou dúvidas
quanto à adoção do sistema de responsabilidade objetiva.
Isso
implica dizer que a rigor a responsabilidade administrativa ambiental
não leva em consideração o elemento subjetivo. Contudo, a sanção
de multa simples é diferente, uma vez que a Lei n. 9.605/98 exige
expressamente a identificação do dolo e/ou da negligência5
(sobre o assunto ver o artigo
https://www.conjur.com.br/2018-abr-01/ambiente-juridico-responsabilidade-subjetiva-multa-ambiental-simples).
De toda forma, existe divergência quanto ao assunto, pois há também
quem defenda que qualquer uma dessas sanções se reja pela
responsabilidade subjetiva6.
O
§
3
do art. 225 da Constituição Federal estabeleceu a tríplice
responsabilização em matéria ambiental, fazendo com que cada lesão
ao meio ambiente seja apurada de forma independente e simultânea nas
esferas administrativa, cível e criminal. Todavia, nem o Ministério
Público nem a Polícia costumam dispor de uma estrutura
fiscalizatória adequada no que diz respeito ao meio ambiente, de
maneira que na prática a imensa maioria das irregularidades
ecológicas são identificadas pelos órgãos
ambientais integrantes do SISNAMA.
Em
vista disso, faz-se necessário que os órgãos ambientais comuniquem
o Ministério Público e a Polícia acerca da infração
administrativa ambiental identificada, a fim de que a possível
responsabilidade civil e criminal decorrente do mesmo fato possa ser
apurada. Em relação à responsabilidade civil, qualquer dano ou
possibilidade de dano ambiental deverá ser comunicado imediatamente
ao Ministério Público, conforme determina a Lei n. 7.347/85 (Lei da
Ação Civil Pública)7.
Já
no que diz respeito à responsabilidade criminal, deve-se fazer a
comunicação ao Ministério Público e à Polícia apenas sobre
aquelas condutas tipificadas a um só tempo como infração
administrativa e como crime ambiental. É importante destacar que
praticamente todas as infrações administrativas ambientais também
podem ser tipificadas como crime, já que os tipos administrativos do
Decreto n. 6.514/08 foram em sua maioria simplesmente copiados dos
tipos criminais da Lei n. 9.605/98.
Uma
das exceções é o art. 76 do mencionado decreto, cuja conduta
descrita seria responsabilizável administrativamente mas não
criminalmente, a qual consiste no ato de “Deixar de inscrever-se no
Cadastro Técnico Federal de que trata o art. 17 da Lei 6.938, de
1981”.
Por
essa razão, faz-se imperioso para a efetivação da tríplice
responsabilização constitucional em matéria ambiental que os
órgãos ambientais dêem ciência ao Ministério Público e à
Polícia a respeito das infrações administrativas ambientais, sob
pena de enquadramento dos responsáveis como criminosos em função
da conduta omissiva, o que é tipificado como crime pela referida
lei.
1
A terminologia “Lei de Crimes Ambientais” não é a opção mais
adequada tecnicamente, uma vez que a Lei n. 9.605/98 também dispõe
sobre responsabilidade administrativa ambiental (arts. 70 a 76),
responsabilidade civil ambiental (arts. 3o
e 4o),
termo de compromisso (art. 79-A) e cooperação internacional
ambiental (arts. 77e 78).
2
“A
sanção decorrente da infração administrativa ambiental cometida
configura-se com a simples lavratura do auto de infração, mas
somente se pode considerar validamente aplicada após a instauração
e a instrução de um processo administrativo, em atenção ao
princípio do devido processo legal (art. 5º, LV, da
CF/88)” (SOARES,
Daniela Dutra; BAPTISTA, Marcela Bentes Alves. Responsabilidade
administrativa. PHILIPPI JR., Arlindo; FREITAS, Vladimir Passos de;
SPÍNOLA, Ana Luíza Silva. Direito
ambiental e sustentabilidade.
Baurueri, SP: Manole, 2016, p. 863).
3
Art.
6º Para imposição e gradação da penalidade, a autoridade
competente observará: I - a gravidade do fato, tendo em vista os
motivos da infração e suas consequências para a saúde pública e
para o meio ambiente; II - os antecedentes do infrator quanto ao
cumprimento da legislação de interesse ambiental; III - a situação
econômica do infrator, no caso de multa.
4
“As
sanções de polícia são aplicáveis nas condições e limites
estabelecidos em lei. Envolvem a multa, a interdição de
atividades, de estabelecimento, demolições, embargo de obra,
proibição de fabricação ou comércio de produtos etc. /As
referidas sanções são auto-executáveis independente de
autorização judicial, em virtude da auto-executoriedade dos atos
de polícia, devendo, a cada sanção a ser aplicada, estar presente
a proporcionalidade entre ela e a infração cometida. /A aplicação
de toda e qualquer sanção depende, para sua validade, que, em
processo administrativo regular, se ofereça ao infrator o direito à
ampla defesa, como já afirmamos” (MUKAI,
Toshio. Direito
ambiental sistematizado.
4. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002, p. 47).
5
Art.
72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes
sanções, observado o disposto no art. 6º: (...) § 3º A multa
simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou
dolo: I - advertido por irregularidades que tenham sido praticadas,
deixar de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do
SISNAMA ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha; II
- opuser embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da
Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha.
6
“Para
ser possível a aplicação da pena administrativa, a semelhança do
que ocorre na seara penal, é necessário haver negligencia,
imprudência, imperícia ou dolo; sem algum desses elementos, não
se justifica a punição administrativa, ainda que seja na seara
ambiental.” (BIM,
Eduardo Fortunato. O mito da responsabilidade objetiva no direito
ambiental sancionador: imprescindibilidade da culpa nas infrações
ambientais. Revista
de direito ambiental,
v. 57, ano 15, 2010, p. 33). “Das dez sanções previstas no art.
72 da Lei n. 9.605 (incs. I a XI). Somente a multa simples utilizara
o critério da responsabilidade com culpa; e as outras nove sanções,
inclusive a multa diária, irão utilizar o critério da
responsabilidade sem culpa ou objetiva, continuando a seguir o
sistema da Lei n. 6.938/81, onde não há necessidade de ser
aferidos o dolo e a negligencia do infrator submetido ao
processo.” (MACHADO,
Paulo Affonso. Direito
ambiental brasileiro.
18. ed. São Paulo: Malheiros: 2010, P. 331).
7
Art.
6º. Qualquer pessoa poderá e o servidor público deverá provocar
a iniciativa do Ministério Público, ministrando-lhe informações
sobre fatos que constituam objeto da ação civil e indicando-lhe os
elementos de convicção.
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