CONSULTORIA
EM DIREITO MINERÁRIO E NEGOCIAÇÃO DE IMÓVEIS
Talden
Farias
Pedro
Ataíde
A
consultoria em Direito Minerário raramente é utilizada nos
contratos de compra e venda de imóveis, inclusive os rurais, cuja
extensão (e, por conseguinte, a probabilidade de existência de
jazida) costuma ser maior. Entretanto, a eventual existência de
atividade mineral pode alterar substancialmente o valor e a
destinação do bem, de maneira que o serviço parece pertinente.
É
sabido que o exercício da mineração (com a única exceção do
regime de licenciamento[1])
independe de consentimento do proprietário do imóvel em que estiver
localizada a jazida, pois esta pertence à União. Contudo, isso não
quer dizer que o minerador pode ingressar na propriedade alheia de
forma desmedida e aleatória, sem qualquer “satisfação” ao
proprietário do solo.
Com
efeito, embora a mineração seja dotada de utilidade pública e de
interesse nacional[2] e
possua inquestionável relevância econômica e social[3],
a sua realização não poderá ignorar a propriedade, pois também
se trata de direito assegurado constitucionalmente[4].
Comumente, fala-se que o solo pertence ao proprietário, e o subsolo,
à União; tal afirmativa, contudo, é equivocada. Nos termos do
artigo 1.229 do Código Civil, “a propriedade do solo abrange
a do espaço aéreo e subsolo correspondentes, em altura e
profundidades úteis ao seu exercício”. A União, na verdade, é
titular do domínio sobre as jazidas que possivelmente existam no
solo ou no subsolo, tanto que os minérios que ocorrem na superfície
terrestre (como a areia e a argila) também constituem bens da União.
Durante
a fase de pesquisa mineral[5],
o proprietário do imóvel em que estiver situada a jazida tem
direito a receber indenização pelos danos previamente identificados
e renda pela ocupação da área. Para tanto, o minerador deverá
procurar o proprietário no intuito de firmar acordo acerca de tais
valores e do modo de pagamento. Se não houver consenso, a Agência
Nacional de Mineral (ANM) enviará ofício ao juiz da comarca
(Justiça comum estadual) para que este arbitre os valores, nos
termos do artigo 27 do Código de Mineração. Após essa etapa,
o minerador deverá depositar em juízo os valores estabelecidos em
sentença, e, ato contínuo, o proprietário/posseiro será intimado
para permitir que o minerador ingresse na área e promova os
trabalhos de pesquisa (podendo existir auxílio da autoridade
policial local em caso de resistência, oposição ou descumprimento
da decisão judicial). A renda não poderá exceder o rendimento
líquido máximo do espaço territorial a ser ocupado; por sua vez, a
indenização não poderá ser superior ao valor venal da propriedade
ocupada[6].
Já
na fase de lavra (efetiva extração do minério), o proprietário do
imóvel em que estiver localizada a jazida fará jus ao recebimento
de indenização, renda e participação nos resultados da lavra; os
valores desta última serão devidos após a negociação do minério
(primeira venda, arrematação, primeira aquisição ou consumo) e
variarão de acordo com a substância mineral e com o volume
extraído. É importante mencionar que a indenização a que se
refere o presente texto é oriunda dos danos previamente
identificados; eventuais danos ocorridos no decorrer da atividade
mineral deverão merecer indenização própria, que será apurada à
parte. Também não se confunde com a recuperação da área
degradada, porque essa já é uma obrigação constitucional (artigo
225, parágrafo 2º) imposta ao minerador[7].
É
nesse contexto que se vislumbra a importância da consultoria em
Direito Minerário durante a aquisição/alienação de imóveis. Não
são raras as vezes em que a área de determinada propriedade está
sendo objeto de direitos minerários, e o respectivo proprietário
ainda não tomou ciência do fato, o que se dá normalmente apenas
quando os trabalhos exigem o ingresso no imóvel. Nesse sentido, o
advogado mineralista poderá informar, com precisão (a partir de
documentos e de dados georreferenciados), se o imóvel objeto de
negociação está ou não onerado por tais títulos. Também poderá
consultar os processos administrativos e mencionar a fase em que se
encontra, bem como se existe expectativa próxima para a realização
de atividade minerária efetiva no local.
Acrescente-se
que não apenas o local exato da jazida estará sujeito à servidão
mineral, mas também as estruturas acessórias, como vias de
transporte, linhas de comunicação, oficinas e moradia. A atividade
minerária deve ser considerada de maneira ampla, uma vez que essa
estrutura é indispensável ao seu adequado desenvolvimento. Nas
poligonais da jazida, o próprio título minerário enseja acordo ou
avaliação judicial para fins de servidão mineral; já nas
estruturas acessórias da mina, a servidão dependerá de delimitação
pela ANM, após análise do requerimento do minerador[8].
Destarte,
o valor e a destinação do imóvel irão variar bastante. Se o
comprador estivesse adquirindo área com baixo potencial produtivo, a
mineração poderá ser considerada um atrativo no valor do bem; isso
porque serão pagos indenização, renda e participação nos
resultados da lavra (se o empreendimento houver alcançado a fase de
extração).
Por
outro lado, se o pretenso adquirente do imóvel tiver a pretensão de
instalar um complexo industrial ou qualquer outra atividade de
considerável valor agregado, a oneração por direitos minerários
possivelmente será um empecilho; isso porque a mineração terá
prevalência em relação aos interesses privados do proprietário.
Ou seja, bastará a existência de título minerário que a área
será ocupada pela atividade. Em tais casos, é possível que a
ocupação do imóvel perdure por décadas, até a exaustão da mina.
Dependendo da forma em que for feita a pesquisa ou extração, e das
peculiaridades do caso concreto, a mineração poderá conviver, no
mesmo imóvel, com outras atividades econômicas desempenhadas pelo
minerador ou pelo superficiário.
O
advogado mineralista poderá alertar o cliente a respeito da
possibilidade de existência de minerais na sua propriedade, caso ele
conheça o potencial da região em questão ou apenas vislumbre a
existência de muitos títulos minerários no entorno. Se houver
interesse, o causídico vai apresentá-lo aos profissionais corretos,
como consultores na área de mineração e de meio ambiente
(geólogos, engenheiros de minas, engenheiros ambientais etc.), que
poderão viabilizar a empreitada.
O
advogado também poderá sugerir o aproveitamento dos minerais de uso
imediato na construção civil (areia, cascalho e brita) na própria
construção que o cliente pretende levar adiante ou em obra de
terceiros. No caso da implementação de um condomínio horizontal ou
de um loteamento, ele pode sugerir a exploração do mineral antes da
implementação do empreendimento, impedindo assim que se perca a
jazida, uma vez que muitos desperdícios ocorrem por falta de
pesquisa mineral.
A
respeito da importância do jurista minerário, vale dizer também
que a existência de títulos minerários, ainda que de terceiros,
pode servir como argumento para tentar impedir a desapropriação da
área para fins de reforma agrária. Com efeito, é de se questionar
se a propriedade onde a atividade minerária está ocorrendo (ou em
vias de ocorrer) cumpre ou não a sua função social, mormente em
função do status constitucional da atividade.
Isso
significa que um bom trabalho de consultoria jurídica imobiliária
não poderá deixar de levar em consideração a incidência ou não
de direitos minerários sobre o imóvel, especialmente quando se
tratar de imóveis rurais.
Nosso agradecimento ao
consultor minerário Manoel Régis de Moura Neto, que fez a gentileza
de ler e de contribuir para o aprimoramento do presente artigo.
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