SANÇÕES
ADMINISTRATIVAS AMBIENTAIS EM ESPÉCIE
Talden
Farias
De
acordo com o artigo 72 da Lei 9.605/98 (que ficou conhecida como “Lei
dos Crimes Ambientais”1)
as infrações administrativas ambientais são punidas com as
seguintes sanções: a) advertência; b) multa simples; c) multa
diária; d) apreensão dos animais, produtos e subprodutos da fauna e
flora, instrumentos, petrechos, equipamentos ou veículos de qualquer
natureza utilizados na infração; e) destruição ou inutilização
do produto; f) suspensão de venda e fabricação do produto; g)
embargo de obra ou atividade; h) demolição de obra; i) suspensão
parcial ou total de atividades; j) restritiva de direitos. O
propósito do presente texto é fazer uma ligeira análise das
sanções administrativas ambientais em espécie, fazendo uma
continuação do artigo
https://www.conjur.com.br/2018-set-15/sancoes-administrativas-ambientais
publicado nesta coluna. Em momento posterior será feito uma análise
de cada uma dessas penalidades administrativas em um artigo
específico.
O
objetivo da advertência ou notificação é formalizar a comunicação
ao infrator sobre determinada irregularidade, estabelecendo forma e
prazo para sua adequação. Trata-se da mais leve das sanções
administrativas ambientais, já que de sua imposição não decorre
nenhum efeito prático imediato, a não ser o início da contagem do
prazo de adequação ao final do qual a atividade poderá ser multada
e embargada. Obviamente esse prazo tem que ser factível, pois a
Administração Pública tem o dever de agir com lealdade e
razoabilidade.
De
acordo com o art. 5º do Decreto n. 6.514/08, essa é uma sanção
aplicada às infrações de menor potencial ofensivo que seriam
aquelas em que a multa máxima cominada não ultrapasse o valor de R$
1.000,00 (mil reais), ou que no caso de multa por unidade de medida a
multa aplicável não exceda o valor referido. Existe a crítica de
que nesse caso o decreto teria extrapolado a sua função, já que a
Lei n. 9.605/98 não estipulou valor ao exigir que a multa simples
seja aplicada após a advertência2.
A advertência serve para ressaltar a função didática e preventiva
dos órgãos ambientais, que muitas vezes são acusados de enfatizar
mais a arrecadação do que a defesa do meio ambiente.
A
multa é a sanção administrativa ambiental de caráter pecuniário
aplicada cujo valor pode variar de R$ 50,00 (cinquenta reais) a R$
50.000.000,00 (cinquenta milhões de reais). O § 3º do art. 72 da
lei em testilha estabelece que a multa simples será aplicada sempre
que o agente, por negligência ou dolo, não sanar as irregularidades
no prazo consignado na advertência ou opuser embaraço à
fiscalização. Isso implica dizer que a lei foi clara ao estabelecer
a modalidade subjetiva de responsabilidade ambiental administrativa,
tema que já foi objeto do artigo
https://www.conjur.com.br/2018-abr-01/ambiente-juridico-responsabilidade-subjetiva-multa-ambiental-simples.
O
art. 74 da Lei 9.605/1998 dispõe que a multa terá por base a
unidade, o hectare, o metro cúbico, o quilograma ou outra medida
pertinente de acordo com o objeto jurídico lesado, cabendo ao órgão
ambiental especificar e justificar a escolha da unidade de medida
aplicável. A multa poderá ser simples, que é aquela aplicada em
função de uma infração administrativa ambiental comum, ou diária,
que é aquela aplicada em razão de uma infração continuada, nos
termos do que estabelece o § 3º do dispositivo citado.
Normalmente
a multa diária é aplicada quando a irregularidade permanece mesmo
após a aplicação da multa simples, embora nada impeça que aquela
modalidade de multa seja aplicada diretamente. O art. 73 determina
que os valores arrecadados com as multas serão revertidos para o
Fundo Nacional do Meio Ambiente, para o Fundo Naval ou para os fundos
estaduais, distrital e municipais de meio ambiente, de acordo com o
órgão responsável pela lavratura do auto de infração. É claro
que as leis estaduais e municipais deverão dispor de maneira
diferente sobre a matéria, tendo em vista a autonomia dos entes
federativos.
Por
falar em autonomia, é importante destacar que não há problema em o
Estado ou o Município se servir do decreto federal desde que haja
expressa previsão legal nesse sentido. Contudo, se dispuser de lei
própria sobre o assunto essa mesma entidade não poderá usar norma
alheia, pois isso implicaria em desrespeito ao princípio da
legalidade, ao princípio da separação de poderes e à própria
autonomia política e administrativa, conforme já estudado no artigo
https://www.conjur.com.br/2018-out-20/uso-norma-impropria-sancoes-administrativas-ambientais.
A
multa simples pode ser convertida em prestação de serviços
ambientais, contribuindo de forma mais efetiva para a preservação,
melhoria e recuperação do meio ambiental, uma vez que o autuado
abre mão da discussão administrativa e judicial e o órgão
ambiental receberá logo o dinheiro, o qual será aplicado
diretamente em finalidades ambientais distintas da que deu causa à
multa. Trata-se de uma medida deveras interessante, tendo em vista
que o retorno dos benefícios com a aplicação desse dinheiro
diretamente pela Administração Pública é sempre mais demorado e
oneroso. Essa matéria foi regulamentada pelo
Decreto Federal n. 9.179, que modificou os artigos 139 e seguintes do
Decreto 6.514/2008, regulamentando, finalmente, o § 4° do art. 72
da lei em comento (assunto que também foi objeto do
https://www.conjur.com.br/2018-jun-22/opiniao-conversao-multa-prestacao-servicos-ambientais).
Se
o mesmo fato que originou o auto de infração lavrado pelo IBAMA foi
objeto de multa administrativa aplicada pelo órgão estadual ou pelo
órgão municipal de meio ambiente, caberá ao infrator fazer o
pagamento junto à entidade que escolher. A Lei n. 9.605/98 foi clara
ao vedar a possibilidade do bis
in idem no
caso de multas administrativas em matéria ambiental3.
Não
é admissível que uma pessoa sofra duas sanções administrativas
semelhantes ao mesmo tempo pelo mesmo fato e sob as mesmas
justificativas na mesma esfera de responsabilização jurídica, que
no caso é a responsabilidade administrativa. É claro que somente o
efetivo pagamento da multa pode justificar o arquivamento do processo
administrativo em tramitação nos outros órgãos ambientais.
O
embargo é a paralisação da atividade ou da obra em decorrência do
descumprimento das condicionantes da licença ambiental ou da
inobservância da legislação vigente. Em virtude do princípio da
proporcionalidade, a aplicação dessa sanção administrativa se
limita à parte irregular do empreendimento4.
Seria
o caso de embargar somente a área do condomínio residencial
horizontal que invadiu a área de preservação permanente, não
sofrendo o restante nenhum tipo de óbice. Com a comprovação de
regularidade ou com a regularização posterior da atividade, o
embargo deverá cessar imediatamente.
Não
ocorrendo ou não podendo ocorrer a regularização posterior, o
embargo se tornará definitivo, devendo ser aplicada a penalidade de
demolição no caso de edificações incompatíveis com a legislação
ambiental, de maneira que se trata de uma medida preventiva e
precaucional. Por conta da autonomia dos entes federativos, somente o
órgão ambiental responsável pela imposição da penalidade poderá
revê-la, a não ser que ocorra ordem judicial nesse sentido.
Os
órgãos integrantes do SISNAMA podem reter um bem obtido ou
transportado de forma irregular, em função da flagrante
irregularidade ou de risco de dano considerável ao meio ambiente.
Podem ser apreendidos animais, produtos e subprodutos da fauna e da
flora, instrumentos, petrechos, equipamentos e veículos de qualquer
natureza utilizados na prática da infração.
Os
animais da fauna silvestre serão libertados em seu hábitat ou
entregues a jardins zoológicos, fundações, entidades de caráter
cientifico, centros de triagem, criadouros regulares ou entidades
assemelhadas, desde que fiquem sob a responsabilidade de técnicos
habilitados, podendo ainda, respeitados os regulamentos vigentes,
serem entregues em guarda doméstica provisória. Já os animais
domésticos ou exóticos mencionados no deverão ser vendidos, ou
doados quando não houver viabilidade econômica na venda.
Os
produtos perecíveis e as madeiras sob risco iminente de perecimento
serão avaliados e doados a instituições de caráter altruístico,
científico ou de saúde. É importante lembrar que o órgão ou
entidade ambiental deverá estabelecer mecanismos que assegurem a
indenização ao proprietário dos animais vendidos ou doados, pelo
valor de avaliação consignado no termo de apreensão, caso esta não
seja confirmada na decisão do processo administrativo.
A
Administração Pública ambiental poderá destruir ou inutilizar
produtos, subprodutos e instrumentos utilizados na prática da
infração quando a medida for necessária para evitar o seu uso e
aproveitamento indevidos nas situações em que o transporte e a
guarda forem inviáveis em face das circunstâncias, ou quando possam
expor o meio ambiente a riscos significativos ou comprometer a
segurança da população e dos agentes públicos envolvidos na
fiscalização. É uma medida preventiva e precaucional adotada para
impedir a ocorrência de danos consideráveis ao meio ambiente,
mormente no caso de substâncias ou produtos tóxicos, perigosos ou
nocivos à saúde humana ou ao meio ambiente.
Por
se tratar de uma sanção mais drástica, que comumente implica em
prejuízo patrimonial ao autuado, o termo de destruição ou de
inutilização deve identificar a avaliação do bem e a
justificativa da adoção da penalidade. Impende dizer que o infrator
deve se encarregar das despesas, em virtude do princípio do
poluidor-pagador.
A
demolição é uma das mais rígidas sanções administrativas
ambientais, em função do seu caráter drástico e irreversível.
Por isso, a penalidade só deve ser aplicada ao final do processo
administrativo, tendo em vista o direito à ampla defesa e ao
contraditório, pois essa sanção não é dotada de
autoexecutoriedade.
As
despesas para a realização da demolição correrão às custas do
infrator, que será notificado para realizá-la ou para reembolsar
aos cofres públicos os gastos que tenham sido efetuados pela
administração. Não será aplicada a penalidade de demolição
quando, mediante laudo técnico, for comprovado que o desfazimento
poderá trazer piores impactos ambientais que sua manutenção, caso
em que a autoridade ambiental, mediante decisão fundamentada,
deverá, sem prejuízo das demais sanções cabíveis, impor as
medidas necessárias à cessação e mitigação do dano ambiental,
observada a legislação em vigor.
A
suspensão de venda ou fabricação de produto constitui um mecanismo
que visa a evitar a colocação no mercado de produtos e subprodutos
oriundos de infração administrativa ao meio ambiente ou que tenha
como objetivo interromper o uso contínuo de matéria-prima e
subprodutos de origem ilegal. Como se trata de uma medida preventiva
e precaucional, o intuito é impedir que produtos nocivos ao meio
ambiente ou à saúde humana circulem no mercado.
A
suspensão parcial ou total de atividades constitui medida que visa a
impedir a continuidade de processos produtivos em desacordo com a
legislação ambiental. Cuida-se de uma penalidade drástica, posto
que implica na interdição da atividade, devendo ser utilizada
apenas quando houver possibilidade de dano significativo ao meio
ambiente e/ou à saúde humana.
As
sanções administrativas ambientais chamadas de restritivas de
direitos são aquelas que impõem uma limitação direta na relação
entre o infrator e a Administração Pública. Segundo o art. 20 do
Decreto n. 6.514/08, são as seguintes as sanções restritivas de
direito: i) suspensão de registro, licença ou autorização; ii)
cancelamento de registro, licença ou autorização; iii) perda ou
restrição de incentivos e benefícios fiscais; iv) perda ou
suspensão da participação em linhas de financiamento em
estabelecimentos oficiais de crédito; e v) proibição de contratar
com a Administração Pública.
A
validade da sanção restritiva de direitos deverá ser fixada pela
autoridade competente, devendo ter o prazo máximo de 1 ano, exceto
para a penalidade de proibição de contratar com a Administração
Pública, cujo prazo máximo é de 3 anos. É claro que a
regularização da conduta que deu origem ao auto de infração
extingue a sanção aplicada, independentemente de prazo.
1
A
terminologia “Lei de Crimes Ambientais” não é a opção mais
adequada tecnicamente, uma vez que a Lei n. 9.605/98 também dispõe
sobre responsabilidade administrativa ambiental (arts. 70 a 76),
responsabilidade civil ambiental (arts. 3o
e 4o),
termo de compromisso (art. 79-A) e cooperação internacional
ambiental (arts. 77e 78).
2
Art.
72. As infrações administrativas são punidas com as seguintes
sanções, observado o disposto no art. 6º: (…) § 3º A multa
simples será aplicada sempre que o agente, por negligência ou
dolo: I
- advertido por irregularidades que tenham sido praticadas, deixar
de saná-las, no prazo assinalado por órgão competente do SISNAMA
ou pela Capitania dos Portos, do Ministério da Marinha; II - opuser
embaraço à fiscalização dos órgãos do SISNAMA ou da Capitania
dos Portos, do Ministério da Marinha.
3
Art.
76. O pagamento de multa imposta pelos Estados, Municípios,
Distrito Federal ou Territórios substitui a multa federal na mesma
hipótese de incidência.
4
“A
proporcionalidade entre a restrição imposta pela Administração e
o benefício social que se tem em vista, sim, constituem requisito
específico para a validade do poder de polícia, como também a
correspondência entre a infração cometida e a sanção aplicada,
quando se tratar de medida punitiva. Sacrificar um direito ou uma
liberdade de um indivíduo sem vantagem para a coletividade invalida
o fundamento social d ato de polícia, pela desproporcionalidade da
medida” (MEIRELLES,
Hely Lopes. Estudos
e pareceres de direito público.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977, v. II, p. 14).
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