AUTORIZAÇÃO PARA A QUEIMA CONTROLADA: LIMITES AO USO DO FOGO NAS PRÁTICAS AGROPASTORIS OU FLORESTAIS
Eduardo Fortunato
Bim
Talden Farias
Além
da autorização para supressão vegetal e da outorga de uso de
recursos hídricos, existem outros atos administrativos autorizativos
ambientais que guardam relação direta com o licenciamento
ambiental. É o caso da autorização para a queima controlada, a
qual permite o uso do fogo nas práticas agropastoris ou florestais
na zona rural sob determinadas condições.
A propósito,
a
Revista de Direito da Cidade publicou recentemente o artigo
científico “Limites ao uso do fogo (queima controlada) no canavial
e em outras práticas agropastoris ou florestais”, também de nossa
autoria
(https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/rdc/article/view/32427).
A
autorização para o uso controlado do fogo é uma atividade
disseminada em praticamente todas as regiões do país, conquanto a
maior parte do seu uso seja voltado ao cultivo da cana-de-açúcar.
Esse procedimento costuma ser de competência dos órgãos estaduais
de meio ambiente, aos quais cabe verificar se estão sendo observadas
as exigências técnicas estabelecidas pelo Decreto 2.661/98, o qual
regulamenta a prática. Nesse diapasão, cabe citar a estipulação
da faixa de segurança de mil metros em relação aos aglomerados
urbanos ou a possibilidade de
haver orientações técnicas adicionais relativas às peculiaridades
locais e climáticas,
dentre outras1.
O
espaço para a discricionariedade técnica do órgão ambiental nesse
caso é inegável. Nada impede,
no entanto, que o Estado legisle sobre a matéria haja vista a
competência concorrente prevista no art. 24, IV, § 2º da Lei
Fundamental. Por outro lado, é possível a revisão da autorização,
seja por suspensão ou por cancelamento do ato administrativo, quando
houver razões de força maior ou descumprimento da legislação2.
A Portaria 345/99 do Ministério do Meio Ambiente também faz
exigências em relação ao uso controlado do fogo no corte da
cana-de-açúcar3.
Essa
é uma autorização independente, específica e de caráter sazonal,
uma vez que a própria prática é marcada pela eventualidade e pela
sazonalidade, não se confundindo com o licenciamento ambiental e nem
se sujeitando, por si só, à exigência de EIA/RIMA. O
entendimento é que, afora o desrespeito à discricionariedade
técnica do órgão e ao princípio da legalidade, essa exigência
seria inconstitucional por força do inciso VI do art. 170 da Lei
Maior, segundo o qual a defesa do meio ambiente deve acontecer por
meio de tratamento proporcional aos impactos ambientais gerados4.
O
uso controlado e condicionado do fogo é utilizado desde tempos
imemoriais, sendo exemplo disso as coivaras que os índios faziam
antes mesmo da chegada dos Europeus no continente americano5.
Já regulamentado nos Códigos Florestais anteriores (de 1934 e de
1965)6,
o instituto foi mantido pelo novo Código Florestal (Lei
12.651/2012), cujo art. 38 previu o uso de mecanismo inclusive em
Unidades de Conservação7.
É
possível ainda o uso para
fins fitossanitários, mormente para evitar
o desenvolvimento de espécies indesejáveis (animais ou vegetais) à
agricultura e à pecuária, e
de pesquisa científica e tecnológica.
A
despeito de sua previsão legal e de sua regulamentação por
decreto, a queima foi objeto de contestação judicial por parte do
Ministério Público e de algumas organizações não governamentais
em alguns Estados. Por conta disso a discussão acabou chegando ao
Supremo
Tribunal Federal (STF), que decidiu no Recurso Extraordinário com
Repercussão Geral (RE-RG) 586.224 pela constitucionalidade do
uso do fogo para toda e qualquer atividade agrossilvipastoril,
conquanto ocorra autorização prévia do órgão ambiental
competente8.
Na decisão consta ainda que aos setores econômicos interessados
incumbe tentar construir a gradual extinção da prática, desde haja
viabilidade técnica e econômica para tanto e ressalvadas
as pequenas propriedades rurais.
A
Suprema Corte entendeu que os aspectos positivos são mais
representativos, como a diminuição dos acidentes de trabalho, a
diminuição do acúmulo de gás metano, a diminuição da incidência
de pragas e a diminuição do uso de pesticidas e fungicidas. Afora
isso, existe também a dimensão social, uma vez que a mecanização
– desejada pelo setor sucro-alcooleiro em razão de vantagens
econômicas – ameaça milhares de empregos. Quanto aos impactos
negativos, a exemplo da piora da qualidade do ar e da eventual
possibilidade da perda de controle do fogo, a compreensão foi de que
é possível minorá-los ou evitá-los por meio de medidas
precaucionais.
Em
igual diapasão, em 2015 o Superior Tribunal de Justiça publicou a
Tese de Direito Ambiental n. 6, segundo a qual “O emprego de fogo
em práticas agropastoris ou florestais depende necessariamente de
autorização do Poder Público”. Isso implica dizer que a matéria
se encontra devidamente pacificada, não havendo mais dúvidas sobre
a sua legalidade e constitucionalidade9.
Foi nesse contexto que o Tribunal Regional Federal da 3a
Região uniformizou o entendimento pela competência do órgão
estadual de meio ambiente, pela não exigência de EIA/RIMA e pela
legalidade da prática10.
1
Art.
1º. É vedado o emprego do fogo: I
- nas florestas e demais formas de vegetação; II - para queima
pura e simples, assim entendida aquela não carbonizável, de a)
aparas de madeira e resíduos florestais produzidos por serrarias e
madeireiras, como forma de descarte desses materiais; b) material
lenhoso, quando seu aproveitamento for economicamente viável; III -
numa faixa de: a) quinze metros dos limites das faixas de segurança
das linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica; b)
cem metros ao redor da área de domínio de subestação de energia
elétrica; c) vinte e cinco metros ao redor da área de domínio de
estações de telecomunicações; d) cinquenta metros a partir de
aceiro, que deve ser preparado, mantido limpo e não cultivado, de
dez metros de largura ao redor das Unidades de Conservação; e)
quinze metros de cada lado de rodovias estaduais e federais e de
ferrovias, medidos a partir da faixa de domínio; IV - no
limite da linha que simultaneamente corresponda: a) à
área definida pela circunferência de raio igual a seis mil metros,
tendo como ponto de referência o centro geométrico da pista de
pouso e decolagem de aeródromos públicos; b) à área cuja
linha perimetral é definida a partir da linha que delimita a área
patrimonial de aeródromo público, dela distanciando no mínimo
dois mil metros, externamente, em qualquer de seus pontos.
§ 1o Quando
se tratar de aeródromos públicos que operem somente nas condições
visuais diurnas (VFR) e a queima se realizar no período noturno
compreendido entre o por e o nascer do Sol, será observado apenas o
limite de que trata a alínea "b" do inciso IV.
§ 2o Quando
se tratar de aeródromos privados, que operem apenas nas condições
visuais diurnas (VFR) e a queima se realizar no período noturno,
compreendido entre o por e o nascer do Sol, o limite de que trata a
alínea "b" do inciso IV será reduzido para mil metros.
§ 3o Após
9 de julho de 2003, fica proibido o uso do fogo, mesmo sob a forma
de queima controlada, para queima de vegetação contida numa faixa
de mil metros de aglomerado urbano de qualquer porte, delimitado a
partir do seu centro urbanizado, ou de quinhentos metros a partir do
seu perímetro urbano, se superior.
Art.
4o.
Previamente à operação de emprego do fogo, o interessado na
obtenção de autorização para Queima Controlada deverá: I
–
definir as técnicas, os equipamentos e a mão-de-obra a serem
utilizados; II –
fazer o reconhecimento da área e avaliar o material a ser queimado;
III –
promover o enleiramento dos resíduos de vegetação, de forma a
limitar a ação do fogo; IV –
preparar aceiros de no mínimo três metros de largura, ampliando
esta faixa quando as condições ambientais, topográficas,
climáticas e o material combustível a determinarem; V –
providenciar pessoal treinado para atuar no local da operação, com
equipamentos apropriados ao redor da área, e evitar propagação do
fogo fora dos limites estabelecidos; VI –
comunicar formalmente aos confrontantes a intenção de realizar a
Queima Controlada, com o esclarecimento de que, oportunamente, e com
a antecedência necessária, a operação será confirmada com a
indicação da data, hora do início e do local onde será realizada
a queima; VII –
prever a realização da queima em dia e horário apropriados,
evitando-se os períodos de temperatura mais elevada e
respeitando-se as condições dos ventos predominantes no momento da
operação; VIII –
providenciar o oportuno acompanhamento de toda a operação de
queima, até sua extinção, com vistas à adoção de medidas
adequadas de contenção do fogo na área definida para o emprego do
fogo. § 1o
O aceiro de que trata o inciso IV deste artigo deverá ter sua
largura duplicada quando se destinar à proteção de áreas de
florestas e de vegetação natural, de preservação permanente, de
reserva legal, aquelas especialmente protegidas em ato do poder
público e de imóveis confrontantes pertencentes a terceiros. § 2o
Os procedimentos de que tratam os incisos deste artigo devem ser
adequados às peculiaridades de cada queima a se realizar, sendo
imprescindíveis aqueles necessários à segurança da operação,
sem prejuízo da adoção de outras medidas de caráter preventivo.
Art.
10. Além de autorizar o emprego do fogo, a Autorização de Queima
Controlada deverá conter orientações técnicas adicionais,
relativas às peculiaridades locais, aos horários e dias com
condições climáticas mais adequadas para a realização da
operação, a serem obrigatoriamente observadas pelo interessado.
2
Art.
14. A autoridade ambiental competente poderá determinar a suspensão
da Queima Controlada da região ou município quando: I
- constatados risco de vida, danos ambientais ou condições
meteorológicas desfavoráveis; II - a qualidade do ar atingir
índices prejudiciais à saúde humana, constatados por equipamentos
e meios adequados, oficialmente reconhecidos como parâmetros; III -
os níveis de fumaça, originados de queimadas, atingirem limites
mínimos de visibilidade, comprometendo e colocando em risco as
operações aeronáuticas, rodoviárias e de outros meios de
transporte.
Art. 15. A Autorização de Queima
Controlada será suspensa ou cancelada pela autoridade ambiental nos
seguintes casos: I - em que se registrarem risco de vida, danos
ambientais ou condições meteorológicas desfavoráveis; II - de
interesse e segurança pública; III - de descumprimento das normas
vigentes.
3
Art.
3o.
A toda queima controlada deverá ser exigida a construção de
aceiros de, no mínimo, cinquenta metros de distância das áreas
florestais, áreas de preservação permanente, áreas de reserva
legal e da faixa de domínio das rodovias.
Art.
4o.
Quando as atividades de queima controlada forem realizadas nas
proximidades das rodovias, deverá ser exigido que os responsáveis
comuniquem com antecedência, mínima de vinte e quatro horas, aos
órgãos de Polícia Rodoviária Estadual ou Federal.
Art.
5o.
Os técnicos responsáveis deverão escalonar as autorizações
visando uma distribuição temporal, a fim de que seja evitado o
acúmulo de atividades de queima controlada em um mesmo dia ou
período.
4
Ementa:
DIREITO CONSTITUCIONAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELO MPF.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. QUEIMA CONTROLADA DE PALHA DE
CANA-DE-AÇÚCAR. LICENÇA AMBIENTAL CONCEDIDA PELO ÓRGÃO
ESTADUAL. IBAMA COMPETÊNCIA SUPLETIVA. (…) 7.
A Constituição Federal, no inciso IV, § 1º, do artigo 225,
previu, portanto, que a exigência de realização de estudo prévio
de impacto ambiental estaria condicionada à reserva de lei. Por sua
vez, o parágrafo único do artigo 27 do revogado Código Florestal
dispôs que "é proibido o uso de fogo nas florestas e demais
formas de vegetação", ressaltando-se que "se
peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em
práticas agropastoris ou florestais, a permissão será
estabelecida em ato do Poder Público, circunscrevendo as áreas e
estabelecendo normas de precaução". Assim, a lei federal não
previu a necessidade da realização de prévio estudo de impacto
ambiental no caso da "queima controlada", mas apenas, por
decreto, de prévia vistoria no caso de solicitação de autorização
para o uso do fogo em áreas "que contenham restos de
exploração florestal [...] limítrofes às sujeitas a regime
especial de proteção, estabelecido em ato do poder público".
8.
Como se observa, a Constituição Federal prevê que, na forma da
lei, seja exigido, pelo órgão competente, o prévio estudo de
impacto ambiental (artigo 225, § 1º, IV, CF), não se admitindo a
atuação substitutiva do Judiciário ao legislador, menos ainda na
conformação positiva do ordenamento jurídico, por derivação
simples, mas essencial do princípio da separação dos Poderes e
devido processo legal. Ainda que a percepção pessoal do julgador,
ou o testemunho de sua experiência de vida, possam dissentir do
juízo adotado pelo legislador, a ação e a decisão judicial não
podem servir de meio para contornar o princípio basilar do Estado
de Direito, para instituir obrigação ou dever não previsto em
lei. Não se trata de substituir a previsão constitucional de lei
pela interpretação judicial de sua dispensa ou inexistência
porque, no fundo, a Constituição Federal conferiu ao Parlamento, e
ao Executivo na respectiva regulamentação, a tarefa de concretizar
a norma constitucional, cabendo ao Judiciário apenas declarar, se
for o caso, sua inconstitucionalidade, enquanto legislador negativo,
e não criar lei ou emprestar interpretação, com assunção
judicial da função de legislador positivo. (...) Apelação Cível
n. 0001063-45.2008.4.03.6116/SP. Processo n. 2008.61.16.001063-9/SP.
TRF-3. RELATOR: Desembargador Federal NERY JUNIOR. REL. ACÓRDÃO:
Desembargador Federal CARLOS MUTA. Publicado em 23.01.2018.
5
A
coivara é uma prática tradicional indígena, também utilizada por
outras populações tradicionais, que consiste na derrubada e na
queima da floresta nativa para o desenvolvimento de agricultura
itinerante, a qual será interrompida depois de alguns anos tendo em
vista o descanso do solo.
6
Código
Florestal de 1934 (Decreto 23.793/34): Art. 22. É prohibido mesmo
aos proprietarios: a)
deitar fogo em campos, ou vegetações, de cobertura das terras,
como processo de preparação das mesmas para a lavoura, ou de
formação de campos artificiaes, sem licença da autoridade
florestal do lugar, e observancia das cautelas necessarias,
especialmente quanto a aceiros, aleiramentos e aviso aos confinantes
(…). Código
Florestal de 1965 (Lei 4.771/65): Art. 27. É proibido o uso de fogo
nas florestas e demais formas de vegetação. Parágrafo único. Se
peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em
práticas agropastoris ou florestais, a permissão será
estabelecida em ato do Poder Público, circunscrevendo as áreas e
estabelecendo normas de precaução.
7
Novo
Código Florestal (Lei 12.651/2012): Art.
38. É proibido o uso de fogo na vegetação, exceto nas seguintes
situações: I - em locais ou regiões cujas peculiaridades
justifiquem o emprego do fogo em práticas agropastoris ou
florestais, mediante prévia aprovação do órgão estadual
ambiental competente do Sisnama, para cada imóvel rural ou de forma
regionalizada, que estabelecerá os critérios de monitoramento e
controle; II - emprego da queima controlada em Unidades de
Conservação, em conformidade com o respectivo plano de manejo e
mediante prévia aprovação do órgão gestor da Unidade de
Conservação, visando ao manejo conservacionista da vegetação
nativa, cujas características ecológicas estejam associadas
evolutivamente à ocorrência do fogo; III - atividades de pesquisa
científica vinculada a projeto de pesquisa devidamente aprovado
pelos órgãos competentes e realizada por instituição de pesquisa
reconhecida, mediante prévia aprovação do órgão ambiental
competente do Sisnama. § 1o
Na situação prevista no inciso I, o órgão estadual ambiental
competente do Sisnama exigirá que os estudos demandados para o
licenciamento da atividade rural contenham planejamento específico
sobre o emprego do fogo e o controle dos incêndios. § 2o
Excetuam-se da proibição constante no caput
as
práticas de prevenção e combate aos incêndios e as de
agricultura de subsistência exercidas pelas populações
tradicionais e indígenas. § 3o
Na apuração da responsabilidade pelo uso irregular do fogo em
terras públicas ou particulares, a autoridade competente para
fiscalização e autuação deverá comprovar o nexo de causalidade
entre a ação do proprietário ou qualquer preposto e o dano
efetivamente causado. § 4o
É necessário o estabelecimento de nexo causal na verificação das
responsabilidades por infração pelo uso irregular do fogo em
terras públicas ou particulares.
8
“(…)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE
ESTADUAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL. LEI MUNICIPAL QUE
PROÍBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR E O USO DO FOGO EM
ATIVIDADES AGRÍCOLAS. LEI MUNICIPAL Nº 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO DE
1995, DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA. RECONHECIDA REPERCUSSÃO GERAL.
ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 23, CAPUT
E
PARÁGRAFO ÚNICO, Nº 14, 192, §1º E 193, XX E XXI, DA
CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO E ARTIGOS 23, VI E VII, 24,
VI E 30, I E II DA CRFB. (…) 3. In
casu,
porquanto inegável conteúdo multidisciplinar da matéria de fundo,
envolvendo questões sociais, econômicas e políticas, não é
permitido a esta Corte se furtar de sua análise para o
estabelecimento do alcance de sua decisão. São elas: (i) a
relevante diminuição – progressiva e planejada – da utilização
da queima de cana-de-açúcar; (ii)
a impossibilidade do manejo de máquinas diante da existência de
áreas cultiváveis acidentadas;
(iii) cultivo
de cana em minifúndios;
(iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v)
e a poluição existente independentemente da opção escolhida.
4. Em que pese a inevitável mecanização total no cultivo da cana,
é preciso reduzir ao máximo o seu aspecto negativo. Assim, diante
dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma
que entende ser devida a execução da necessidade de sua respectiva
população. Tal diploma reflete, sem dúvida alguma, uma forma de
compatibilização desejável pela sociedade, que, acrescida ao
poder concedido diretamente pela Constituição, consolida de
sobremaneira seu posicionamento no mundo jurídico estadual como um
standard
a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federação
adstritas ao Estado de São Paulo. (…) 7. Entretanto, impossível
identificar interesse local que fundamente a permanência da
vigência da lei municipal, pois ambos os diplomas legislativos têm
o fito de resolver a mesma necessidade social, que é a manutenção
de um meio ambiente equilibrado no que tange especificamente a
queima da cana-de-açúcar. 8. Distinção entre a proibição
contida na norma questionada e a eliminação progressiva disciplina
na legislação estadual, que gera efeitos totalmente diversos e,
caso se opte pela sua constitucionalidade, acarretará esvaziamento
do comando normativo de quem é competente para regular o assunto,
levando ao completo descumprimento do dever deste Supremo Tribunal
Federal de guardar a imperatividade da Constituição. 9. Recurso
extraordinário conhecido e provido para declarar a
inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 1.952, de 20 de dezembro
de 1995, do Município de Paulínia” (STF, Pleno, RE-RG
586.224/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. em 5.03.2015, DJe
7.05.2015).
9
O
Tribunal Regional Federal da 3a
Região prolatou interessantes decisões sobre a matéria, cabendo
destacar os seguintes casos: i) Embargos de Declaração em
Apelação/Remessa Necessária n. 0011027-50.2008.4.03.6120/SP.
Processo n. 2008.61.20.011027-5/SP. RELATORA: Desembargadora Federal
DIVA MALERBI. Publicado em: 19.03.2018, ii) Apelação Cível n.
0002615-76.2007.4.03.6117/SP. Processo n. 2007.61.17.002615-9/SP.
RELATORA: Desembargadora Federal DIVA MALERBI. Publicado em:
19.03.2018 e iii) Apelação Cível n. 0001063-45.2008.4.03.6116/SP.
Processo n. 2008.61.16.001063-9/SP. TRF-3. RELATOR: Desembargador
Federal NERY JUNIOR. REL. ACÓRDÃO: Desembargador Federal CARLOS
MUTA. Publicado em 23.01.2018. Cumpre destacar parte do primeiro
acórdão: “(…) 2.
Pelo RE 586.224/SP, houve declaração de inconstitucionalidade de
lei municipal que vedava, por completo, a prática da queima de
cana-de-açúcar, dada a sua incompatibilidade com lei estadual –
no caso, a Lei Paulista nº 11.241/2002 - que impõe a respectiva
eliminação, mas de forma gradativa, até o ano de 2031. Esse
julgado avançou no tema, reconhecendo que a eliminação gradual da
prática de queima, contraposta à respectiva eliminação abrupta,
surge como o meio mais adequado de compatibilização de interesses
relativos à dignidade humana, saúde e proteção ao trabalho,
entre o mais. 3.
Também o E. Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o
tema da queima da cana-deaçúcar, já se posicionou no sentido de
que tal prática, embora inflija certos danos ambientais, não é
ilegal, se realizada com amparo em autorizações expedidas pelos
órgãos ambientais competentes, como no caso ora sob exame, a
CETESB (AgRg no AREsp 48.149/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Primeira Turma, DJe: 17/04/2012). 4.
Merece registro, ainda, a jurisprudência pacífica do E. Tribunal
de Justiça de São Paulo, no sentido de que o art. 27 da Lei
4.771/65 (antigo Código Florestal) permitia o emprego do fogo em
práticas agropastoris, se precedida de permissão do Poder Público,
disposição essa que, em essência, foi repetida pela novel
Codificação Florestal (Lei nº 12.651/12), no seu art. 38, inciso
I, a qual estabeleceu que, em locais ou regiões cujas
peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas
agropastoris ou florestais, este será possível mediante prévia
aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama,
para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá
os critérios de monitoramento e controle (TJSP; Apelação
4010911-86.2013.8.26.0506; Rel. Des. Eutálio Porto; 2ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente; j. em 10/03/2016; Apelação
0007768-15.2010.8.26.0070; Rel. Des. Torres de Carvalho; 1ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente;
j.
em 24/04/2014)” (…).
10
O
Tribunal Regional Federal da 3a
Região prolatou interessantes decisões sobre a matéria, cabendo
destacar os seguintes casos: i) Embargos de Declaração em
Apelação/Remessa Necessária n. 0011027-50.2008.4.03.6120/SP.
Processo n. 2008.61.20.011027-5/SP. RELATORA: Desembargadora Federal
DIVA MALERBI. Publicado em: 19.03.2018, ii) Apelação Cível n.
0002615-76.2007.4.03.6117/SP. Processo n. 2007.61.17.002615-9/SP.
RELATORA: Desembargadora Federal DIVA MALERBI. Publicado em:
19.03.2018 e iii) Apelação Cível n. 0001063-45.2008.4.03.6116/SP.
Processo n. 2008.61.16.001063-9/SP. TRF-3. RELATOR: Desembargador
Federal NERY JUNIOR. REL. ACÓRDÃO: Desembargador Federal CARLOS
MUTA. Publicado em 23.01.2018. Cumpre destacar parte do primeiro
acórdão: “(…) 2.
Pelo RE 586.224/SP, houve declaração de inconstitucionalidade de
lei municipal que vedava, por completo, a prática da queima de
cana-de-açúcar, dada a sua incompatibilidade com lei estadual –
no caso, a Lei Paulista nº 11.241/2002 - que impõe a respectiva
eliminação, mas de forma gradativa, até o ano de 2031. Esse
julgado avançou no tema, reconhecendo que a eliminação gradual da
prática de queima, contraposta à respectiva eliminação abrupta,
surge como o meio mais adequado de compatibilização de interesses
relativos à dignidade humana, saúde e proteção ao trabalho,
entre o mais. 3.
Também o E. Superior Tribunal de Justiça, ao se debruçar sobre o
tema da queima da cana-deaçúcar, já se posicionou no sentido de
que tal prática, embora inflija certos danos ambientais, não é
ilegal, se realizada com amparo em autorizações expedidas pelos
órgãos ambientais competentes, como no caso ora sob exame, a
CETESB (AgRg no AREsp 48.149/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves,
Primeira Turma, DJe: 17/04/2012). 4.
Merece registro, ainda, a jurisprudência pacífica do E. Tribunal
de Justiça de São Paulo, no sentido de que o art. 27 da Lei
4.771/65 (antigo Código Florestal) permitia o emprego do fogo em
práticas agropastoris, se precedida de permissão do Poder Público,
disposição essa que, em essência, foi repetida pela novel
Codificação Florestal (Lei nº 12.651/12), no seu art. 38, inciso
I, a qual estabeleceu que, em locais ou regiões cujas
peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em práticas
agropastoris ou florestais, este será possível mediante prévia
aprovação do órgão estadual ambiental competente do Sisnama,
para cada imóvel rural ou de forma regionalizada, que estabelecerá
os critérios de monitoramento e controle (TJSP; Apelação
4010911-86.2013.8.26.0506; Rel. Des. Eutálio Porto; 2ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente; j. em 10/03/2016; Apelação
0007768-15.2010.8.26.0070; Rel. Des. Torres de Carvalho; 1ª Câmara
Reservada ao Meio Ambiente;
j.
em 24/04/2014)” (…).
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